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Éric Diego Barioni

Produtos brilhantes, intenções obscuras

23 de Maio de 2025 às 22:45
Cruzeiro do Sul [email protected]
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. (Crédito: ARQUIVO)

No próximo 31 de maio, sábado, o Dia Mundial sem Tabaco será comemorado mais uma vez. A data foi instituída pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1987 e visa promover alertas e ações de conscientização acerca das táticas enganosas e propagandas insidiosas da indústria do tabaco, dos riscos de agravos à saúde associados ao tabagismo e da importância de se instituir políticas públicas de saúde que visem reduzir o tabagismo e o número de mortes evitáveis causadas direta e indiretamente pelo tabaco.

Essa comemoração associada a tantas outras ações regulatórias implementadas no Brasil desde as décadas de 1980 e 1990 contribuíram significantemente para a redução do tabagismo. Na Vigitel 2023, é possível observar que a frequência de fumantes no Brasil diminuiu no período de 2006 a 2023, variando de 15,7% (2006) a 9,3% em 2023. A meta é chegar em 5,9% em 2030 (redução de 40% à luz dos dados do Vigitel). Porém, desde 2018 (período de 2018 a 2023), esses números estão estagnados em aproximadamente 9,3% e não diminuíram mais.

Para além do aspecto regulatório, a própria forma de uso de cigarros convencionais, cachimbos e charutos foi se tornando desafiador, principalmente entre os mais jovens. Fumar causa mau hálito, modifica a cor dos dentes, mãos e dedos. A fumaça impregnada nas roupas e cabelos ou a incomodar mais as pessoas, e todos esses atributos negativos aram a integrar uma barreira de proteção a mais contra o tabagismo, a dependência à nicotina e a exposição a tantas outras substâncias tóxicas.

Na era dos “pods” e “vapes”, pela ampla disseminação de cigarros eletrônicos ou sistemas eletrônicos de liberação de nicotina, o uso desses dispositivos parece ter superado qualquer barreira legal ou atributo negativo imposto pela própria forma de uso desses aparelhos. Esse arranque da indústria do tabaco pode estar influenciando os números estagnados mostrados acima, e está disparadamente à frente de qualquer ação de proteção que tenhamos no Brasil, uma vez que proibir importação, propaganda, fabricação e comércio interno sem fiscalização, beira a ingenuidade.

“Vapes” e “Pods” não causam mau hálito e, aparentemente, não modificam a cor dos dentes, mãos e dedos. O vapor gerado por esses dispositivos não impregna nas roupas e cabelos e dificilmente incomoda as pessoas como a fumaça de um cigarro convencional. Apesar disso, esses dispositivos são geradores de vapor tóxico e, sem as barreiras impostas pela própria forma de uso dos cigarros, as chances de se tornar um dependente de nicotina e ser potencialmente mais exposto a outras substâncias tóxicas é maior.

No Brasil, a falta de fiscalização e a regulação que simplesmente proíbe escancaram o problema da venda de dispositivos e insumos clandestinos. A pessoa que escolhe comprar e utilizar no Brasil não sabe o que está consumindo. Para além disso, a propaganda insidiosa e enganosa na internet e redes sociais dialoga justamente com crianças e adolescentes, que são o público alvo da indústria e desses dispositivos tecnológicos tão cheios de cores, aromas e sabores.

A campanha do Dia Mundial sem Tabaco deste 31 de maio de 2025 tem justamente como tema, o slogan: “produtos brilhantes, intenções obscuras: desvendando ou desmascarando o apelo” e visa alertar a sociedade sobre o impacto das táticas enganosas e imorais de celebridades patrocinadas que estão influenciando o nosso presente e o nosso futuro. As ruas já não são mais tão perigosas quanto a internet e redes sociais, será? É preciso educar, orientar e vigiar.

Éric Diego Barioni é biomédico, mestre e doutor em ciências/toxicologia e atua como coordenador de curso, pesquisador e educador em saúde na Universidade de Sorocaba (Uniso).