MPC recomenda multa por compra de 1 milhão de livros
Orgão vinculado ao TCE-SP considerou falta de planejamento e quantidade excessiva
O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) considerou irregular a compra de mais de 1 milhão de livros, no valor de quase R$ 30 milhões, realizada pela Secretaria de Educação de Sorocaba em 2020. A aquisição foi feita durante a gestão da então prefeita Jaqueline Coutinho, por meio de uma ata de registro de preços vinculada ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Segundo o TCE, o processo foi conduzido sem planejamento adequado e com justificativas genéricas. Parte dos livros está sendo usada na rede municipal pelo governo de Rodrigo Manga, prefeito que sucedeu Jaqueline.
O pedido de análise partiu do Ministério Público de Contas (MPC-SP), que apontou, além das justificativas insuficientes para as aquisições, uma superestimativa dos itens comprados, o que configura risco de dano ao erário e prejuízo à comunidade escolar. De acordo com o órgão, o excesso de materiais e a falta de planejamento adequado caracterizam falhas graves no processo.
Diante das irregularidades, o MPC recomenda a anulação dos atos istrativos da Prefeitura de Sorocaba relacionados à contratação, incluindo os termos de adesão à ata, os empenhos e a execução do contrato. Também sugere a aplicação de multa de 300 Unidades Fiscais do Estado de São Paulo (Ufesps) — equivalente a R$ 11.106 — aos responsáveis, além do encaminhamento do caso ao Ministério Público Estadual e ao Ministério Público Federal para apuração de possíveis responsabilidades por uso inadequado de recursos públicos.
Segundo o MPC, “o Executivo sorocabano adquiriu 1.005.285 livros paradidáticos para uma rede municipal com apenas 59.131 alunos matriculados, pelo valor total de R$ 29.469.437,99 (recursos do Tesouro municipal e do Governo Federal)”.
A procuradora de Contas Élida Graziane Pinto, que analisou o caso, destacou que todo o processo estaria comprometido “pelas deficiências identificadas na etapa interna de compra realizada pelo município”. Ela ressaltou ainda que “as falhas apontadas pela fiscalização revestem-se de maior gravidade, tanto pelo risco de dano ao erário municipal quanto pelo severo prejuízo à comunidade escolar”.
Em seu parecer, a procuradora também defendeu o envio dos autos ao Ministério Público Estadual e ao Ministério Público Federal “devido à possível inadequação das despesas com recursos públicos municipais e federais destinados à educação”, para que sejam tomadas as providências cabíveis.
Ex-prefeita
A ex-prefeita Jaqueline Coutinho afirmou à reportagem que ainda não foi intimada da decisão. “Mas posso garantir que a compra dos livros foi absolutamente regular e legal, tendo sido adquiridos do próprio Governo do Estado, que conduziu a licitação. Portanto, não houve qualquer infração à Lei de Licitações ou a normas legais. Inclusive, a compra atendeu à Lei Federal 12.244/10, vigente à época. Embora não tenha tomado ciência da decisão, afirmo que irei recorrer, dada minha certeza da regularidade do procedimento.”
Jaqueline acrescentou que suas contas de 2020, ano da aquisição, foram aprovadas pela Câmara Municipal.
A Prefeitura de Sorocaba, por sua vez, informou que também não foi notificada da decisão e destacou que a compra ocorreu na gestão anterior. “Atualmente, a maior parte desses livros compõe os acervos das unidades escolares; outros foram entregues aos estudantes, e parte foi destinada ao acervo dos docentes”, afirmou o Executivo.
Arena
A compra de pouco mais de um milhão de livros, em 2020, gerou polêmica após o material ficar estocado na Arena Sorocaba. O caso veio à tona quando vereadores denunciaram a situação e o prefeito Rodrigo Manga visitou o local em janeiro de 2021, no início de sua gestão. Na época, Jaqueline Coutinho já defendia a legalidade da aquisição.
A pandemia dificultou o trabalho da Comissão Parlamentar de Inquérito (I), presidida então pelo vereador Vinícius Aith, atual secretário de Inclusão e Transtorno do Espectro Autista (TEA) no governo Manga. Parte das oitivas ocorreu a portas fechadas, sem transmissão pela TV Câmara. O relatório da I apontou que houve irregularidade.
O jornal Cruzeiro do Sul revelou que a ex-prefeita tentou barrar a I judicialmente, alegando vícios em sua criação. A reportagem mostrou ainda que materiais destinados para idosos, como o Manual do Consumidor do Idoso, foram comprados pela Prefeitura de Sorocaba em 2020, junto com materiais paradidáticos adquiridos para atender crianças da rede municipal de educação.